Ramagem gastou R$ 12 mil com publicidade e assinou contrato de aluguel mesmo foragido

Documentos da Câmara mostram que despesas de mídia e locação seguiram ativas após início da fuga, em 9 de setembro


Por Cleber Lourenço | ICL Notícias

A documentação oficial da Câmara dos Deputados mostra que Alexandre Ramagem manteve gastos regulares da cota parlamentar mesmo depois de deixar o Brasil e ser considerado foragido pela Justiça. A apuração da jornalista Juliana Dal Piva revela que o deputado iniciou sua fuga em 9 de setembro, quando embarcou para os Estados Unidos. Ainda assim, o gabinete seguiu operando como se nada tivesse acontecido — com despesas de publicidade, produção audiovisual, impulsionamento de conteúdo e locação de veículos sendo registradas normalmente, como se o parlamentar ainda estivesse no país exercendo a rotina do mandato.

Deputado Federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) | Carolina Antunes

Entre setembro e outubro de 2025, os registros indicam R$ 12.885,42 gastos sob a justificativa de “divulgação da atividade parlamentar”, além da assinatura de um contrato de aluguel de veículo no território nacional durante o período em que Ramagem já se encontrava nos EUA.

Gastos detalhados com publicidade digital

As notas fiscais analisadas detalham a manutenção de uma estrutura de comunicação digital ativa, mesmo com o parlamentar ausente. Os fornecedores e valores são os seguintes:

6Telos Cursos e Treinamentos Ltda — R$ 2.150 (setembro)
  • elaboração de estratégias digitais;
  • edição de vídeos;
  • gestão de redes sociais (Instagram e Facebook);
  • relatório de desempenho.

6Telos Cursos e Treinamentos Ltda — R$ 2.150 (outubro)
  • serviços idênticos aos de setembro, indicando uma contratação mensal recorrente.

Nadryv Filmes Ltda — R$ 7.500 (outubro)
  • gravação e edição de vídeos;
  • finalização de peças audiovisuais;
  • nota fiscal emitida sob código de “produção de eventos”, apesar de descrever serviço digital.

Facebook Serviços Online do Brasil Ltda — R$ 1.085,42 (outubro)
  • impulsionamento de publicações;
  • pedidos de veiculação de anúncios registrados diretamente na plataforma.

O conjunto revela que o gabinete manteve produção de vídeos, abastecimento das redes sociais e compra de alcance publicitário por meio de impulsionamento — uma rotina típica de atuação parlamentar — mesmo sem o deputado estar no Brasil. As despesas transmitem uma aparência de continuidade e normalidade institucional, como se o exercício do mandato não tivesse sido afetado pela fuga.

Contrato de locação assinado durante a fuga

A documentação também inclui um contrato de locação de veículos assinado pelo próprio Ramagem enquanto ele já se encontrava nos Estados Unidos. O contrato aparece registrado normalmente na cota parlamentar, sem indicação sobre quem utilizava o automóvel no Brasil ou qual seria sua pertinência com o mandato durante a ausência prolongada do deputado.

Contrato de locação assinado por Ramagem (Imagem: Reprodução)

O que dizem as regras da Câmara

O Código de Ética e Decoro Parlamentar estabelece limites claros para o uso de recursos públicos. Entre eles, destaca-se o Inciso VII, que veda o uso indevido de verbas do gabinete e de qualquer recurso público associado ao mandato.

Inciso VII — uso indevido de verbas públicas ou recursos do gabinete

O dispositivo proíbe despesas incompatíveis com os princípios da administração pública — legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Na prática, isso inclui:
  • uso da cota parlamentar para fins pessoais;
  • desvio de finalidade de despesas;
  • pagamento de funcionários fantasmas;
  • empregar assessores em atividades não permitidas;
  • transformar o gabinete em extensão de interesses particulares.

É o dispositivo que costuma enquadrar casos de rachadinha, uso irregular da cota e outras práticas envolvendo desvio de recursos públicos.

A Câmara determina que toda despesa da cota deve ter pertinência com o exercício do mandato. Isso significa que o gasto precisa estar ligado a atividades parlamentares reais, realizadas no território nacional.

Quando o deputado está fora do Brasil, essa conexão desaparece. Em termos diretos:
  • não há atividade parlamentar presencial a ser desempenhada;
  • não há deslocamento vinculado ao mandato a justificar aluguel de carro;
  • qualquer uso do veículo deixa de ter finalidade pública.

Mesmo que se argumente que “assessores estavam usando o carro”, as regras exigem:
  • comprovação formal de agenda;
  • vínculo claro com as funções do mandato;
  • proporcionalidade e pertinência.

Sem isso, configura-se desvio de finalidade, já que o gasto passa a atender interesses privados ou partidários.

Se os órgãos de controle confirmarem que a despesa não tinha finalidade pública, o caminho institucional é conhecido:
  • devolução do valor à Câmara;
  • apuração por CGU ou TCU por dano ao erário;
  • enquadramento no Inciso VII do Código de Ética;
  • risco de responsabilização por improbidade administrativa ou peculato;
  • possibilidade de enriquecimento ilícito indireto, caso terceiros tenham se beneficiado do veículo.

Ausência física e continuidade dos gastos

Embora o regimento permita que contratos sejam assinados mesmo quando o parlamentar está no exterior, ele exige que cada despesa seja exclusivamente ligada ao exercício do mandato. A continuidade das despesas com publicidade digital e locação de veículos após 9 de setembro — período em que Ramagem fugiu para os Estados Unidos — evidencia inconsistências entre a finalidade da cota e a situação concreta do deputado.

Os documentos revelam que o gabinete manteve uma operação administrativa e comunicacional plena, como se Ramagem ainda estivesse no Brasil, reforçando uma aparência de normalidade institucional mesmo com o parlamentar já foragido e fora do território nacional.

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