Vídeo exclusivo: Senador almoça com presidente da Conafer preso na CPMI do INSS (VIDEO)

Parlamentares apostam que conexões políticas do presidente da Conafer deram a ele certeza de impunidade no depoimento à CPMI do INSS: "muita gente está com o rabo preso"


Henrique Lessa | nd+, Brasília

O presidente da Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais), Carlos Roberto Ferreira Lopes, preso após mentir em depoimento à CPMI do INSS, cultivava fortes conexões políticas em Brasília. Entre as evidências, um vídeo mostra o senador Izalci Lucas (PL-DF) buscando Lopes para um almoço, um episódio que reforça a suspeita de relações privilegiadas da entidade com integrantes do Congresso.

Senador Izalci Lucas e Carlos Lopez, presidente da Conafer, preso durante a CPMI do INSS – Foto: Saulo Cruz e Carlos Moura/Agência Senado

Apontado como um dos principais operadores do esquema contra aposentados do INSS, Lopes manteve postura calma e altiva no depoimento à CPMI. O comportamento chamou atenção de parlamentares que, reservadamente, atribuíam sua confiança à rede de relações políticas que mantinha.

Vídeo flagra encontro entre Izalci e o presidente da Conafer, preso na CPMI do INSS

No vídeo do encontro, o senador Izalci Lucas (PL-DF), um dos mais ativos parlamentares na CPMI do INSS, busca o presidente da Conafer na sede da entidade, no Setor Comercial Sul de Brasília, por volta das 10h.

O material, conseguido com exclusividade pelo ND Mais, mostra o encontro, registrado em 30 de abril de 2024, onde se vê o senador Izalci dirigindo o próprio carro, uma SUV preta, apesar de senadores utilizarem, em regra, carros oficiais com motorista.

Após a reportagem mostrar o vídeo ao senador Izalci, ele confirmou o encontro e que conhecia o dirigente da Conafer. “Sim, é o cara da Conafer, eu fui presidente da comissão da Medida Provisória 759, da regulação fundiária, ele fez algumas audiências, ele pediu para participar”, disse o senador.

Questionado sobre o vídeo ser muito mais recente do que a discussão da MP 759, que tramitou em 2016, época em que ocupava o cargo de deputado federal, o atual senador disse que a entidade tinha uma série de ações importantes para a agricultura familiar.

“Eu estive na Conafer, fui conhecer. Conversei com ele, tirei fotografia. Eu o conheci aqui (Senado), eu o chamei para audiência pública, até achei que a Conafer era uma entidade sindical, mas é uma associação. Eu fui conhecer lá, tinha a questão dos índios, ele mexe com a agricultura familiar. Em todos os assentamentos em Brasília eu falei com a Conafer, eles têm uma equipe boa em todos os assentamentos. Eles têm um trabalho grande na agricultura familiar”, detalhou Izalci.

Problema?

Alertado que no vídeo ele estava dando uma carona ao presidente e não visitando a entidade investigada Izalci apenas disse: “Mas qual o problema?”

Apesar de o senador ser apoiador do ex-presidente Jair Bolsonaro, outro parlamentar bolsonarista ao ver o vídeo comentou, reservadamente, que percebeu que o senador teria sido “leve” no depoimento de Lopes.

“Você reparou que ele (Izalci) pegou muito leve na oitiva (do presidente da Conafer) e depois sumiu do plenário. Acontece que esses caras (dirigentes das associações investigadas) têm conexões com muita gente aqui, da esquerda, do centrão, até da direita, muita gente está com o rabo preso, mas nós vamos apurar tudo”, garantiu.

Laranja recebe R$ 9 milhões em emendas parlamentares

Questionado, o senador Izalci garantiu que nunca encaminhou nenhuma emenda parlamentar para a Conafer, mas, ao consultar o portal de transparência, é possível encontrar uma emenda de autoria dos senadores Izalci e de Weverton Rocha (PDT-MA) no valor de R$ 3.818.090,00 direcionada ao ITT (Instituto Terra e Trabalho).

O ITT é apontado pelas investigações como uma entidade laranja de Carlos Lopes. No depoimento ele admitiu que Thamires Maia de Oliveira, funcionária da tesouraria da Conafer, é esposa de Vinícius Ramos da Cruz, presidente do ITT e cunhado do próprio Lopes. Segundo ele o instituto seria como o “braço de execução” de várias entidades, incluindo a Conafer.

Os quase R$ 4 milhões foram pagos pelo Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária) em 13 de junho de 2025, mais de 50 dias depois da deflagração da Operação Sem Desconto, pela Polícia Federal, que investiga exatamente os descontos do INSS por essas entidades.

Cerca de três meses antes, em 17 de março de 2025, a entidade também recebeu mais R$ 5 milhões do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar) através de uma emenda de autoria do deputado Eros Biondini (PL-MG).

Bancada Conafer

A boa relação de Lopes, e da Conafer, com o parlamento é uma das mais robustas entre as entidades investigadas e pode ser percebida no êxito da criação da FPMDER (Frente Parlamentar Mista em Defesa do Empreendedorismo Rural), uma frente parlamentar basicamente da entidade.

Lançada com pompa e circunstância no Salão Nobre da Câmara em 17 de abril de 2024, no evento só se via a logomarca da Conafer. Com 218 deputados e senadores, segundo a página da própria entidade, a frente “tem o desafio de promover o aperfeiçoamento da legislação e a criação de políticas públicas para o setor”.

O lançamento da frente no ano passado contou com discursos de Carlos Lopes, do presidente da nova frente, o deputado federal Fausto Pinato (PP-SP) e do vice-presidente, senador Chico Rodrigues (PSB-RR).

No evento Rodrigues enalteceu a entidade e sua relação com a agricultura familiar: “a gente tem que iniciar falando que essa palavra já está no nosso DNA, pois Conafer significa Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais do Brasil”, disse o senador por Roraima.

Quem também participou da cerimônia e destacou o mérito pela criação da Frente foi o senhor Pedro Neto, secretário adjunto de Inovação e Cooperativismo do Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária), apontado por colaboradores da Conafer como uma pessoa muito próxima ao presidente Carlos Lopes.

“Venho aqui hoje em nome do ministro Carlos Fávaro, que está cumprindo uma extensa agenda e fiz questão de que o representante dele hoje fosse eu para trazer essa mensagem de que o empreendedorismo rural brasileiro, ele é algo que transcende as linhas do campo“, disse Pedro Neto durante o evento.

Mansão da Conafer

O endereço onde funcionava a FPMDER, local onde os parlamentares se reuniam para almoços e jantares com os integrantes do setor era uma bela mansão no Lago Sul, bairro nobre de Brasília. Na fachada do imóvel, ainda é possível observar, nas imagens disponíveis no Google Street View, a placa com o logotipo identificando a frente parlamentar.

O imóvel com revestimentos em mármore e duas cascatas, além de diversos outros luxos, foi alugada pela entidade associativa como comprova o documento de locação ao qual o ND Mais teve acesso.

Depois da deflagração da Operação Sem Desconto e o congelamento das contas da Conafer, a entidade acabou sendo despejada da grande loja que ocupava no Setor Comercial Sul de Brasília. Sem sede, Carlos Lopes tirou a placa da Frente Parlamentar e começou a despachar da mansão.

Mas o novo endereço da entidade não durou muito tempo. Na manhã da última segunda-feira (29), mesmo dia em que Carlos Lopes prestou o depoimento para a CPMI do INSS, a entidade foi despejada da mansão. Com apoio da Polícia Militar, foi cumprida uma ordem de despejo por aluguéis atrasados.

Relações familiares e poder

Assim como outras entidades, a Conafer tinha relação com diversas entidades dirigidas por familiares do presidente, como ele mesmo admitiu no depoimento à CPMI do INSS. Mas foi por meio de outra relação pessoal, mesmo que indireta, que a entidade chegou dentro do gabinete do então ministro da previdência, Carlos Luppi (PDT).

A chefe da comunicação do INSS, na gestão de Alessandro Stefanutto, a jornalista Martha Imenes, tinha uma relação pessoal com Adriano, um dos motoristas da Conafer. O ex-companheiro da assessora foi apontado, reservadamente, por alguns ex-funcionários da entidade como o “entregador” de Carlos Lopes.

O companheiro de Martha, segundo essas fontes, seria o encarregado de entregar “presentes” e até mesmo carros para alguns “figurões” de Brasília relacionados com Carlos Lopes.

Martha, que possui uma empresa de comunicação, deixou o INSS cerca de dois meses antes da deflagração da Operação Sem Desconto e assumiu a chefia da Ascom (Assessoria de Comunicação) do Ministério da Previdência, ainda sob o comando de Carlos Lupi (PDT). Com a saída de Lupi, pouco depois da deflagração da Operação Sem Desconto, Martha também deixou o Ministério.

Ao ND Mais, Martha confirmou o relacionamento com Adriano por mais de três anos, mas disse que viveram juntos por um período muito curto, e que, antes da operação da PF, o relacionamento já teria terminado.

Sobre as atividades do ex-companheiro ela confirmou que ele trabalhava como motorista para a Conafer, mas negou saber de qualquer entrega de presentes.

“Ele era, ele é motorista da Conafer, ele que viajava entregando sêmen e essas coisas, mas ele não era motorista pessoal do Carlos. Ele era bocudo, qualquer coisa que acontecia ele comentava, ele nunca falou nada sobre entregar carros”, disse a assessora.

Reservadamente, ex-funcionários da entidade dizem que a assessora de Lupi teria, através da sua empresa, apresentado uma proposta de trabalho para a entidade, o que a jornalista nega. Martha admite que esteve apenas em uma oportunidade na Conafer, em 2024, para negociar a entrega de donativos para o Rio Grande do Sul, na época da enchente no estado.

“Na época da enchente do Sul eu precisava mandar o que o INSS arrecadou e eles estavam enviando carretas para lá e para cá. A Rafaela esteve no INSS e pegou as doações e mandou, mas eu fui na Conafer apenas uma vez para combinarmos isso (a entrega dos donativos) com eles”, disse Martha.

Ela conta que a ideia da parceria veio do companheiro Adriano, mas diz que toda a negociação foi apenas para o transporte dos donativos ao estado gaúcho. A reportagem tentou contato inúmeras vezes com Adriano mas ele não respondeu as nossas solicitações de comentários. O ex-ministro Carlos Lupi também foi contatado mas não respondeu. O espaço segue aberto para o posicionamento.


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