Teve até ocultação com despesa de folha salarial, segundo técnicos do TCE-RJ. Conselheiros e Câmara aprovaram contas, apesar das graves irregularidades. Tudo foi revelado
EcoSerrano
Documentos do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) e do Ministério Público de Contas (MPC) apontam extrapolação do limite de pessoal, divergências milionárias na dívida e sete impropriedades graves nas contas de 2023 do prefeito Johnny Maycon. Técnicos pediram reprovação, mas o Plenário decidiu pela aprovação com ressalvas.
Um exercício de 2023 marcado por falhas graves
A análise das contas públicas do prefeito Johnny Maycon revela um quadro de irregularidades que acende o alerta sobre a gestão fiscal municipal. Documentos oficiais do TCE-RJ e do Ministério Público de Contas mostram erros significativos e indicam falta de controle e transparência na administração municipal, especialmente no que se refere às despesas com pessoal e à dívida consolidada do município.O processo, que envolveu análise técnica minuciosa e pareceres do MPC, resultou em unanimidade pela reprovação das contas, mas o Plenário do TCE decidiu, surpreendentemente, aprovar com ressalvas. Posteriormente, a Câmara Municipal referendou o acórdão com 17 votos a favor e apenas 1 contrário, formalizando a aprovação parcial das contas.
A irregularidade central: despesa com pessoal acima do limite legal
O ponto mais grave identificado pelos auditores foi a extrapolação do limite de 54% da Receita Corrente Líquida (RCL) para despesas com pessoal. A Auditoria Financeira que subsidiou o processo detectou uma subavaliação de R$ 25.445.133,61 nas despesas não incluídas no Relatório de Gestão Fiscal (RGF).“Ao corrigir essa omissão, o percentual de despesa com pessoal saltou para 55,91% da RCL”, destacam os autos do processo. Em termos práticos, enquanto a prefeitura declarava 52,6% de gasto com pessoal, a análise técnica revelou que o número ultrapassava o limite legal, já no primeiro quadrimestre de 2023.
O TCE-RJ considerou que essa extrapolação representa descumprimento direto da Lei de Responsabilidade Fiscal, justificando, por si só, a emissão de Parecer Prévio Contrário.
Sete impropriedades que reforçam o diagnóstico técnico
Além do excesso de gastos com pessoal, os auditores identificaram sete impropriedades que evidenciam falhas graves na gestão fiscal do município:- Divergência milionária na dívida consolidada: O Relatório de Gestão Fiscal indicava uma dívida de R$ 72,5 milhões. No entanto, o Demonstrativo da Dívida Fundada registrava R$ 635,4 milhões — uma diferença de R$ 562,9 milhões, considerada pelos técnicos como fator que “compromete a confiabilidade das contas”.
- Não cumprimento de metas fiscais: O município não alcançou metas definidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), revelando falhas de planejamento e execução orçamentária.
- RPPS em desequilíbrio: O Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) utilizou reservas de servidores ativos para pagar aposentados e pensionistas, apontando risco à sustentabilidade do sistema.
- Reincidência e descumprimento de determinações: O município não seguiu recomendações anteriores do TCE, o que, segundo a Lei Orgânica do Tribunal, pode justificar a reprovação das contas por reincidência.
- Demais impropriedades, detalhadas nos autos, reforçam o diagnóstico técnico e foram corroboradas pelo MPC.
O Ministério Público de Contas (MPC) também emitiu parecer decisivo. O órgão qualificou a situação como “descontrole das despesas com pessoal” e endossou integralmente a recomendação de Parecer Prévio Contrário, sugerindo inclusive notificações à Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e ao Ministério Público Estadual.
“O MPC … opinou de forma decisiva pela emissão de Parecer Prévio Contrário”, destacam os documentos oficiais.
A defesa da Prefeitura e a refutação técnica
A Prefeitura de Nova Friburgo apresentou múltiplos argumentos para justificar a exclusão de determinados gastos da folha de pessoal:- Alegações baseadas no Decreto Legislativo nº 79/2022 e em aditivos de Termos de Ajustamento de Conduta (TACs), para afastar a inclusão de despesas com Organizações Sociais (OS);
- Contratos com a EBMA (limpeza urbana), argumentando que não haveria substituição de mão de obra;
- Contratos e acordos com a JMF Soluções em Saúde, alegando decisões judiciais que dispensariam a inclusão das despesas.
As coordenações técnicas do TCE (CAF e CSC-Municipal) analisaram cada argumento e rebateram peça a peça. Entre os principais pontos:
- A Secretaria do Tesouro Nacional já esclareceu que o Decreto Legislativo não afasta a obrigação de registrar despesas das OS para fins da LRF;
- TACs e decisões judiciais não se sobrepõem à LRF;
- A existência de cargos de Agente de Limpeza Urbana caracteriza substituição de mão de obra, devendo as despesas ser incluídas na folha.
Segundo os técnicos: “Sem qualquer divergência entre as áreas técnicas, a rejeição da defesa foi unânime”. Aceitar as justificativas abriria precedentes contrários à legislação nacional e comprometeria a segurança jurídica da gestão pública.
A decisão do Plenário: aprovação com ressalvas
Apesar da unanimidade técnica, o Plenário do TCE-RJ optou por Parecer Prévio Favorável com Ressalvas. A relatora reconheceu os achados técnicos, mas ponderou fatores como o ineditismo do controle, proteção da confiança legítima do gestor e risco à isonomia entre municípios.O acórdão final não negou as irregularidades — concordou com todas as análises técnicas —, mas transformou a reprovação recomendada em ressalvas, provocando questionamentos sobre o papel técnico-jurídico do Tribunal no processo.
“…o Acórdão Final do TCE-RJ resultou na aprovação das contas com ressalvas”, afirmam os documentos.
Câmara Municipal: referendo da aprovação
Em 2 de outubro, a Câmara Municipal de Nova Friburgo referendou o acórdão do TCE por 17 votos a favor e 1 contra. O único voto contrário foi do vereador Marcos Marins, que ressaltou:“Zelar pelas contas públicas é zelar pela confiança do povo… A Câmara recebeu apenas o acórdão final e não as mais de 6 mil páginas do processo com os pareceres técnicos.”
A maioria justificou o voto pelo alinhamento com o acórdão do TCE, tratando o documento como orientação técnica.
Consequências práticas e riscos
A aprovação com ressalvas não gera sanções automáticas ao prefeito. No entanto, os achados técnicos permanecem nos autos e podem gerar efeitos concretos:- Risco fiscal real: O desequilíbrio do RPPS e a divergência contábil de R$ 562,9 milhões podem limitar acesso a financiamentos e exigir medidas urgentes de ajuste;
- Pressão por correções: O TCE e o MPC sugerem que a Prefeitura apresente um plano público detalhado, ajustando dívida, RPPS e reclassificando despesas;
- Possíveis investigações: Se STN, MP-RJ ou outros órgãos identificarem indícios de dolo ou má-fé, podem surgir processos administrativos ou judiciais.
O Portal EcoSerrano entrou em contato com todos os vereadores, mesmo os que não votaram, sobre a decisão da aprovação das contas de Johnny Maycon. O Prefeito Johnny Maycon e o vice-prefeito não responderam aos contatos do portal. Os vereadores Angelo Gaguinho, Jose Carlos Schuabb, Wallace Piram, Joelson do Pote, Tia Karla, Bruno Silva, Evandro Miguel, Cascão do Povo, Ghabriel do Zezinho, Rômulo Pimentel e Janio de Carvalho também não responderam.
Abaixo, os vereadores que retornaram o contato do EcoSerrano:
- Dirceu Tardem (presidente da Câmara): explicou, via Procuradoria, que o processo passou pela Comissão de Finanças e foi votado em plenário com acesso completo ao parecer técnico do TCE-RJ. Segundo ele, a aprovação com ressalvas tem respaldo jurídico e contábil e o Parlamento não pode reabrir a questão.
- Maicon Gonçalves: afirmou que o TCE-RJ apontou ressalvas, mas não irregularidades graves. Reconheceu o parecer técnico como vinculante e justificou seu voto a favor da aprovação, mantendo cobrança por ajustes e responsabilidade na gestão.
- Mayara Felício: justificou ausência por agenda na capital com a deputada Benedita da Silva, mas acompanhou o parecer técnico do TCE, manifestando voto favorável à aprovação.
- Isaque Demani (lider de governo): explicou que, embora ausente na sessão, votaria pela aprovação das contas. Lembrou que o STF, na ADI 849, decidiu que as Câmaras Municipais não podem reprovar contas por critérios políticos, dando força vinculante ao parecer do TCE-RJ. “Os Conselheiros do TCE, após análise técnica e aprofundada, aprovaram as contas com ressalvas, o que é absolutamente normal.”
- Cláudio Damião: confirmou alinhamento com o parecer técnico do TCE-RJ e enfatizou que todos os procedimentos foram realizados conforme a legislação e com transparência.
- Marcos Marins: O vereador Marcos Marins esclarece que votou pela reprovação das contas de 2023 de Nova Friburgo, seguindo o corpo técnico do TCE-RJ e o Ministério Público de Contas, que apontaram irregularidades graves. Apesar da aprovação com ressalvas pela Câmara, ele reforça que muitas orientações do TCE ainda não foram cumpridas e reafirma seu compromisso com a transparência e a responsabilidade fiscal.
- Carlinhos do Kiko: informou, via assessoria, que prefere que a Comissão de Finanças responda oficialmente sobre o caso.
- Max Bill: disse confiar integralmente no TCE-RJ e que seguiu o parecer do órgão, aprovando as contas de Johnny Maycon.
LEIA A JUSTIFICATIVA NA ÍNTEGRA DE TODOS OS VEREADORES
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