OUTRO LADO: Defesa diz que 'continuará empenhado a comprovar que não praticou crime algum'
Ministério Público pediu a prisão de parlamentar por descumprimento de medidas protetivas de Cíntia Chagas
Isabella Menon | Folha de S.Paulo
São Paulo - O Ministério Público de São Paulo afirma, em denúncia oferecida à Justiça nesta quinta-feira (23), que o deputado estadual Lucas Bove (PL) tinha o costume de fumar maconha e apontar uma arma para a ex-mulher, a influenciadora Cíntia Chagas.
A Promotoria pediu a prisão preventiva do parlamentar por "reiterados descumprimentos de medidas protetivas" da influencer. A Justiça ainda não se manifestou. O foro especial de deputados estaduais não abarca esse tipo de caso.
À reportagem a defesa de Bove, composta pelo advogado Daniel Bialski, afirma que ele recebeu a denúncia e o pedido de prisão com surpresa. "Inexistem razões, pressupostos e ou requisitos para a cogitação ou adoção dessa medida", diz.
A defesa diz ainda que já se manifestou formalmente contra o pedido da Promotoria, e reafirma que Bove "confia na Justiça e continuará empenhado a comprovar que não praticou crime algum".
O episódio em que Bove teria apontado uma arma para Cíntia foi classificado como intimidação ostensiva pela Promotoria.
Ainda segundo a peça, uma testemunha presenciou, em 2024, o deputado fumar maconha e apertar o bico do peito da influenciadora por cima da roupa e, por vezes, colocava a mão debaixo da roupa de Cíntia e dizia "olha o que eu faço com a sua amiga". O episódio teria deixado ambas constrangidas, ainda de acordo com a denúncia.
A Promotoria ainda cita outras ameaças e intimidações, desde 2022, como a obrigação de mostrar constantemente o lugar e com quem estava. Em um dos casos, ele obriga a influenciadora a apagar foto da campanha publicitária, que ela postou se exercitando com roupas de ginástica e disse que ela estava com a "perna arregaçada" e que ela tinha de "ser decente daqui por diante".
Em uma das brigas do casal, no ano passado, o deputado teria afirmado a uma amiga da influenciadora: "Cadê aquela vagabunda? Eu vou matar ela". No mesmo dia, teria dito a Cíntia que "você só não vai apanhar agora porque tem 6 milhões de seguidores". Na sequência, diz a denúncia, aproximou-se do rosto com o punho fechado e ameaçou queimar seus pertences.
Em setembro de 2024, Cíntia relatou à polícia abusos físicos e psicológicos sofridos durante o relacionamento com o deputado. O inquérito sobre o caso foi concluído em 15 de setembro deste ano e encaminhado à Justiça.
No pedido de prisão, a promotora Fernanda Raspantini Pellegrino afirma que "o autor possui a devida ciência acerca da necessidade de respeitar as medidas protetivas, porém, ele não o faz por acreditar que não será responsabilizado pelas consequências de seus atos".
Em sua denúncia, o Ministério Público avançou em relação ao inquérito policial. Na conclusão da investigação, a delegada responsável pelo caso havia negado a prática de lesão corporal, envolvendo uma faca, por suposta falta de provas. Na conclusão, foi descrito que não foi possível constatar se as manchas roxas apresentadas pela influenciadora em fotografias eram ou não decorrentes de atos consentidos por ela.
A decisão foi criticada pela defesa da vítima. "Entendo que a denúncia deve englobar a violência física, comprovada nos autos", afirmou a advogada Gabriela Manssur à época.
Divergindo da autoridade policial, a Promotoria considerou o relato. Pelas redes sociais, Cíntia comentou a decisão. "Para quem duvidou: lesão corporal. Hoje, durmo aliviada. Sigo acreditando na Justiça."
Nas redes, o deputado criticou a denúncia e escreveu que "a militância feminista que alcançou o poder público deixa claro que, se você for mulher, não precisa cumprir as regras impostas pela Justiça, sua palavra vale mais que suas ações, do que seu histórico".
"Na qualidade de deputado, (...) sinto vergonha em nome de milhares de vítimas reais de violência que muita vezes deixam de denunciar justamente pela descredibilização que as falsas denúncias trazem à causa", continuou.
Já Cíntia afirmou que recebe a decisão com serenidade e inabalável confiança na Justiça e pede que as mulheres vítimas de violência não se calem e que o silêncio "protege o agressor". "Trata-se de um homem público, e é moralmente inaceitável que agressores de mulheres permaneçam investidos em funções de poder. A violência contra a mulher não se circunscreve à esfera privada: constitui crime e afronta à dignidade humana."
A advogada da influenciadora disse que a denúncia "representa um marco importante para as mulheres na busca pela verdade, pela responsabilização e pela dignidade da vítima". "A mensagem que fica é clara: ninguém está acima da lei e da justiça".
"Essa atuação demonstra que a lei existe para todas e contra todos que a violarem, independentemente de quem sejam ou do cargo que ocupem."
O caso
Cíntia Chagas prestou depoimento à Polícia Civil em setembro do ano passado e relatou uma série de abusos durante a relação de pouco mais de dois anos com o deputado. Eles haviam se divorciado em agosto.
Segundo a influencer, tudo começou com episódios de ciúme — Bove perguntava constantemente onde a parceira estava e pedia provas, como fotos e vídeos.
Isso teria evoluído para ataques verbais e físicos, e Cíntia afirmou que o marido a humilhava, proferindo diversos xingamentos, como burra. A influencer também disse que Bove a agredia, deixando lesões, e já teria arremessado contra ela uma faca, que atingiu sua perna.
Após a denúncia, a 3ª Delegacia de Defesa da Mulher instaurou inquérito policial e solicitou medida protetiva para Cíntia, concedida pela Justiça.
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