Centrão quer autorizar Congresso a demitir cúpula do Banco Central, em meio à operação Master-BRB

Projeto altera lei da independência do BC e permite ao Congresso exonerar presidente e diretores do banco em casos de ‘desempenho insuficiente’; procurado, BC não se manifestou


Por Alvaro Gribel e Célia Froufe (Broadcast) | O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA - O Partido Progressistas (PP) recolhe assinaturas na tarde desta terça-feira, 2, para aprovar um pedido de urgência na tramitação de um projeto de lei que permite ao Congresso destituir presidentes e diretores do Banco Central.

O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, ao lado de diretores que compõem o Comitê de Política Monetária (Copom) Foto: Raphael Ribeiro/BC

A iniciativa, que vem sendo endossada por outros partidos do Centrão, da oposição e até da base do governo, ocorre em meio à análise do BC sobre a compra de um pedaço do Banco Master pelo Banco de Brasília (BRB), controlado pelo governo do Distrito Federal.

O projeto altera a lei que instituiu a autonomia do Banco, em 2021 (leia mais abaixo), e, na prática, enfraquece a autoridade monetária perante interesses de deputados e senadores. Hoje, somente o Presidente da República tem essa atribuição. Pelo projeto, a Câmara autorizaria a abertura do processo, mas a votação final seria feita pelo Senado.

O requerimento de urgência acelera a tramitação de um projeto no Congresso, permitindo que ele “pule” formalidades, como a análise do texto por comissões.

“Se o Congresso pode afastar o Presidente da República, por que não poderia afastar um diretor do Banco Central?”, disse ao Estadão o deputado Doutor Luizinho (RJ), líder do PP na Câmara. Também nesta terça-feira, a federação União Progressista (que reúne o PP e o União Brasil) anunciou sua saída do governo Lula. Procurado, o Banco Central não quis se manifestar.

“Requeremos, nos termos do art. 155 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, URGÊNCIA para a tramitação do Projeto de Lei Complementar nº 39 de 2021, que altera a Lei Complementar nº 179/2021 para definir ações de fiscalização das atividades da diretoria do Banco Central do Brasil, atribuídas ao Congresso Nacional”, diz o texto assinado pelo deputado Claudio Cajado (PP-BA). Procurado, o deputado não se manifestou.

A urgência já conta com a assinatura de líderes de vários partidos do Congresso, incluindo o Republicanos - partido do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).

Além de Cajado e do Doutor Luizinho, assinaram Isnaldo Bulhões Jr (MDB-AL), líder do MDB; Pedro Lucas Fernandes (União/MA), líder do União Brasil; Pedro Campos (PSB-PE), líder do PSB; Sóstenes Cavalcanti (PL-RJ), líder do PL; e Gilberto Abramo (Republicanos-MG), líder do Republicanos.

Os líderes estão reunidos neste momento na residência oficial da Câmara, Hugo Motta. Há relatos de que Motta também estaria articulando a volta desse texto com urgência.

Segundo apurou a reportagem, os requerentes já conseguiram o número mínimo de assinaturas necessárias para fazer o texto tramitar novamente. A intenção seria votar a urgência ainda nesta terça-feira, 2.

Critérios

Pela justificativa do projeto, a estabilidade de diretores do BC pode implicar “sérias consequências ao País”.

Hoje, os diretores e presidente do BC só podem ser afastados de seus cargos, segundo a Lei Complementar 179, de 2021, pelo presidente da República, mas atendendo a alguns critérios, como:

1. pedido feito pelo nomeado;
2. doença que incapacite o membro do colegiado a prosseguir com sua atividade;
3. condenação;
4. desempenho insuficiente para atingir os objetivos do Banco Central.

“Essa estabilidade no cargo, em termos práticos, poderá implicar em sérias consequências para o País, caso os indivíduos que venham a ocupar esses cargos possuam um desempenho insuficiente, pois não fica claro na lei de quem é a responsabilidade de exercer tal fiscalização e avaliação”, diz o texto patrocinado pelo PP.

O projeto pretende instituir um novo dispositivo na lei que instituiu a independência do Banco Central:

“A lei complementar nº179/2021 passa a vigorar acrescido dos seguintes dispositivos ao seu artigo 5º:

V - a requerimento aprovado pela maioria absoluta da Câmara dos Deputados quando a condução das atividades do Banco Central for incompatível com os interesses nacionais.

§4º Na hipótese do inciso V, a proposta de exoneração ficará condicionada à aprovação, por maioria absoluta, do Senado Federal.”

O projeto que está sendo resgatado agora é de autoria do então deputado pelo PSB-AP, Camilo Capiberibe. A justificativa para o texto na ocasião era a seguinte: “Os membros da diretoria e o presidente do Banco Central somente são efetivados após aprovação em sabatina realizada pelo Senado Federal. De forma análoga, entendemos que a exoneração dos mesmos também esteja vinculada à avaliação das casas legislativas”.

Para serem efetivados em seus cargos, os indicados pelo presidente da República precisam passar pelo crivo de senadores da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE).

Ao Estadão/Broadcast, Capiberibe se mostrou surpreso com o uso de seu texto tantos anos depois e com a autonomia operacional já aprovada - este era o contexto de sua medida. “É bem a minha cara esse projeto. É meu modo de fazer política, com mais intervenção, mas não sei por que resgataram isso agora”, questionou.

Caso Master

Na semana passada, o Estadão/Broadcast mostrou que o “risco CPF” está por trás da divisão interna no Banco Central sobre o desfecho da venda de um pedaço do banco Master para o BRB. Enquanto a autorização da operação depende do diretor de Organização do Sistema Financeiro e de Resolução, Renato Dias Gomes, uma possível liquidação do Master - em caso de problemas de liquidez do banco - dependeria da assinatura do diretor de Fiscalização, Ailton Aquino.

Se o negócio for autorizado, mas levar a problemas para o BRB, um banco público, pode haver questionamentos sobre Renato Gomes, por ter encaminhado o voto a favor. Se o negócio for negado, mas os problemas do Master se agravarem a ponto de chegar a um caso extremo de liquidação, aí será a área de Aquino, que cuida da fiscalização, que ficará em xeque, por não ter visto o risco Master crescer a tempo. Por isso, o encaminhamento do voto é visto como uma “batata quente” entre as diretorias.

O que é a autonomia do Banco Central?

A autonomia operacional do BC foi aprovada em 2021, na gestão de Roberto Campos Neto.

Pela lei, o presidente e os diretores do BC passaram a ter mandatos fixos de quatro anos, não consecutivos com a gestão do presidente da República, responsável pelas indicações. De 2023 a 2024, o País conviveu pela primeira vez com um BC que não havia sido formado pelo governo.

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Grato por sua colaboração.

  1. Curioso que deputados queiram controlar o Banco Central logo após a PF descobrir que o PCC atua na Faria Lima. O que esses políticos querem se metendo com bancos? Seria mais um braço do PCC no Congresso Nacional?

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