Ação da PF pressiona Zema e respinga em nomes para a sucessão ao governo de Minas

Entre acusados de fraudar projetos de mineração estão pessoas ligadas a Pacheco, Silveira e Nikolas, que atuam por 2026


Por Lucas Altino | O Globo — Rio de Janeiro

As fraudes em projetos de mineração reveladas pela Polícia Federal na Operação Rejeito elevaram a pressão sobre a administração do governador Romeu Zema, em Minas, e também respingaram em outros personagens políticos ligados ao estado. Zema, que demorou mais de 24 horas para se manifestar sobre a operação, agora pode ter que enfrentar uma CPI na Assembleia Legislativa. Em Brasília, a deputada federal Duda Salabert (PDT-MG) também tenta colocar uma CPI de pé na Câmara, que poderia ampliar as investigações sobre órgãos federais, como a Agência Nacional de Mineração (ANM). Entre os presos pela operação, há pessoas ligadas a Jair Bolsonaro, Nikolas Ferreira (PL-MG), Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Alexandre Silveira (PSD-MG).

Romeu Zema, Nikolas Ferreira, Alexandre Silveira e Rodrigo Pacheco — Foto: Júlia Aguiar/Agência O Globo, Washington Alves/Light Press/Agência O Globo / Anderson Araujo/Valor, Brenno Carvalho/Agência O Globo

Segundo as investigações, o esquema poderia alcançar lucros de até R$18 bilhões para o grupo criminoso, formado por empresários, políticos, diretores de órgãos federais e estaduais de Minas, que obtiam autorizações para exploração mineral em locais originalmente proibidos através de pagamentos de propinas e influência política.

Deputados da oposição dizem que estão perto das 26 assinaturas necessárias para abrir a CPI na Assembleia Legislativa de Minas (ALMG) e acusam o governo Zema de omissão mesmo após denúncias anteriores à operação.

Com a temperatura política interna elevada, Romeu Zema precisa das respostas sobre o caso de corrupção justamente no momento que tenta viabilizar sua candidatura à presidência, no ano que vem. Há um mês, ele oficializou sua pré-candidatura, em um evento em São Paulo, e vem sendo um dos governadores de direita mais enfáticos nas críticas à gestão Lula.

— A Assembleia enfrentou fortemente os crimes na mineração quando aprovou a Lei Mar de Lama Nunca Mais (após os desastres de Mariana e Brumadinho). Apesar disso, anos depois a investigação da PF mostrou que ainda há crime a ser enfrentado, dano ambiental a ser combatido e secretaria de meio ambiente a ser vigiada — afirmou a deputada estadual Lohanna França (PV) . — A postura do governo é inconsequente e de quem reconhece, nas atitudes, que tem culpa, porque estão operando contra a CPI.

O deputado Professor Cleiton (PV-MG) disse que o escândalo foi produzido por uma "quadrilha que se instaurou na administração do NOVO em Minas Gerais".

— O Governador tenta descolar a sua imagem desse escândalo, mas contribuiu diretamente para o que está ocorrendo. Uma série de decretos permissivos, uma reforma administrativa que fragilizou a fiscalização. Foram diversas denúncias pela imprensa e pela ALMG que não resultaram em nada, em um claro trabalho do núcleo do governo Zema pra abafar a situação. Os avisos foram muitos.

No dia seguinte à Operação, Romeu Zema afirmou que "já havia suspeitas da CGE" e cobrou punições exemplares aos envolvidos. Na última sexta-feira, o vice-governador, Mateus Simões (Novo), destacou que foram exonerados sete servidores em função das acusações. Em entrevista ao jornal O Tempo, ele defendeu uma atuação “severa” do poder público contra a corrupção, sem "passar pano para absolutamente ninguém que comete deslize".

Ainda que não tenha atingido secretários diretamente, a Operação Rejeito prendeu integrantes do segundo escalão do governo, como Fernando Baliani, diretor Regional da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam). Nesse ano, ele havia sido demitido e readmitido do cargo em três semanas. Primeiro, dia 19 de julho foi demitido por “graves descumprimentos de deveres funcionais”, por determinação da Controladoria Geral do Estado (CGE). Mas, no dia 9 de agosto, sua demissão foi revertida em suspensão e ele foi readmitido, por decisão do próprio controlador-geral do estado, Rodrigo Fontenelle.

Outro alvo da PF foi o ex- presidente da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam), Rodrigo Gonçalves Franco. Ele foi nomeado em novembro de 2023 por Zema, apenas três meses após o governador ter indicado a recondução do presidente anterior. Uma "mudança de ideia" que não costuma ser comum nesse tipo de processo, apontam pessoas que acompanham a política ambiental mineira.

Franco foi exonerado há uma semana, quatro dias antes da Operação, por causa de "fofocas" nos bastidores, segundo o secretário de Comunicação de Minas, Bernardo Santos. No entanto, em audiência pública realizada pela Comissão de Direitos Humanos da ALMG, nesta quinta (25), a secretária de Meio Ambiente, Marília de Carvalho Melo, disse que, na verdade, ele foi exonerado devido a uma denúncia formal encaminhada à Controladoria-Geral do Estado (CGE). Na mesma audiência, o controlador-geral do Estado, Rodrigo Fontenelle, disse que seis processos de licenciamento ambiental estão sob investigação.

A audiência foi marcada pelo protesto de deputados da oposição, que cobravam a CPI. A base do governo Zema, que é maioria na ALMG, rebatia dizendo que a investigação deve ficar a cargo apenas da Polícia Federal, e lançando críticas à gestão federal, também afetada pela Operação Rejeito. Em resposta, os opositores destacavam que a deputada federal Duda Salabert (PDT-MG), da base do governo federal, está articulando uma CPI na Câmara, o que comprovaria que não há pré disposição em blindar o governo Lula nesse assunto.

Dois dos presos pela PF foram indicados pelo Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD-MG): um dos diretores da Agência Nacional de Mineração (ANM) Caio Trivelatto, e Rodrigo Teixeira, que até ano passado era diretor da Polícia Administrativa da PF e, desde o início desse ano, trabalhava no Serviço Geológico Brasileiro (SGB). Como revelou a coluna da Malu Gaspar, Teixeira era, até a data da operação, integrante do Comitê de Segurança, Meio Ambiente e Saúde da Petrobras, indicado por Silveira por fazer parte do grupo dos “Silveirinhas”, como é conhecido o pessoal de confiança do ministro.

Na segunda (22), Alexandre Silveira disse ter ficado surpreso com as prisões e cobrou investigações.

— Ficamos todos surpresos. É importante ressaltar que os dois nomeados no governo federal foram afastados, o que demonstra a prioridade das instituições sobre as pessoas, visando garantir que a justiça cumpra sua função — disse.

Outro preso pela operação foi Felipe Lombardi Martins, ex-assessor do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), apontado como pré-candidato ao governo de Minas com apoio de Lula. Segundo a PF, Felipe Lombardi Martins era o "operador financeiro" da organização e definido como "homem da mala".

Seus crimes teriam acontecido depois de sua atuação, entre 2019 e 2021, como assessor de Pacheco. A aproximação entre os dois aconteceu por intermédio de João Alberto Lages, ex-deputado estadual pelo MDB e apontado pela PF como um dos líderes do grupo criminoso. Em 2014, Lages concorreu às eleições em uma dobradinha com Pacheco.

Procurado, o senador Rodrigo Pacheco confirmou conhecer Lages, "em razão da militância político-partidária" e que na mesma época conheceu Lombardi, que trabalhou na sua equipe do Senado. Pacheco destacou que não teve conhecimento sobre as atividades de Lombardi após seu desligamento.

Ligação com bolsonaristas

O homem apontado pela PF como "articulador interinstitucional da organização criminosa" recebeu apoio de Jair Bolsonaro (PL) e do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) em sua tentativa de concorrer à presidência do Crea-MG, em 2023. Voluntário da campanha de Bruno Engler (PL-MG) a prefeito de Belo Horizonte, o geógrafo Gilberto Horta de Carvalho mostra, nas suas redes, proximidades com nomes importantes do bolsonarismo.

Em um vídeo de novembro de 2023, Ferreira pediu votos a Carvalho sob o argumento de ele ser uma pessoa de direita.

— A gente sabe que durante muito tempo a esquerda se aparelhou nesses conselhos e a gente precisa desaparelhar isso para, no final das contas, servir a quem é de direita — disse Nikolas no vídeo.

Na sequência, no vídeo, Carvalho disse que sua candidatura servia para "limpar o sistema de engenheiros da esquerda". Ele perdeu a eleição para Marcos Gervásio. Em suas redes sociais, o geógrafo mostra que trabalhou na campanha de Bruno Engler (PL-MG) para prefeito de Belo Horizonte ano passado. Procurado, Engler afirmou que ele era um voluntário.

A foto de perfil de Carvalho no Instagram é justamente uma imagem ao lado do ex-presidente Jair Bolsonaro, que também pediu votos para Carvalho na campanha à presidência do Crea.

— Ninguém no mundo todo tem o potencial que nós temos em recursos minerais. Vote em conservadores e pessoas de direita que vão revolucionar de verdade esse setor tão importante para todos nós — disse Bolsonaro, no vídeo ao lado de Carvalho.

A proximidade de Carvalho com o meio bolsonarista teria impulsionado, inclusive, uma denúncia de suposta irregularidade eleitoral feita ano passado por Nikolas Ferreira contra Duda Salabert. Segundo a PF, a denúncia foi abastecida por informações do grupo criminoso, que tinha Salabert como rival por sua atuação em defesa da Serra do Curral, um dos locais explorados pela mineração.

O inquérito da Operação Rejeito, obtido pelo OGLOBO, reuniu prints de conversa que mostram João Lages enviando arquivos sobre as supostas irregularidades eleitorais de Salabert a Gilberto Carvalho, em 8 de outubro de 2024. Na sequência, Lages pede “jornalismo investigativo em cima dela”. Em resposta, Carvalho promete que não iria revelar que Lages era a fonte daquelas informações. Ele completa afirmando que entregaria os arquivos para "pessoas capacitadas". Em novembro, Nikolas protocolou a denúncia.

Procurado, Nikolas Ferreira disse que a denúncia "teve como fundamento informações já publicadas em veículos de imprensa de grande circulação".

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