Caso Ultrafarma: Secretaria da Fazenda de SP afasta mais seis fiscais investigados pelo MP em desvio bilionário

Pasta afirma ter aberto processos administrativos disciplinares contra os servidores. Fiscais entraram no alvo do MP-SP após certificados digitais em nome deles, e que seriam usados em operações fraudulentas, serem descobertos.


Por Rodrigo Rodrigues, Isabela Leite e Léo Arcoverde | g1 SP e GloboNews — São Paulo

A Secretaria da Fazenda do estado de São Paulo (Sefaz-SP) afastou sete fiscais que estão sendo investigados pelo Ministério Público de São Paulo (MP-SP) por suposta participação no esquema de desvios bilionários da pasta, que foi alvo de mega-operação no início do mês.

Sidney OIiveira, fundador da Ultrafarma, e Mario Otávio Gomes, diretor estatutário do grupo Fast Shop: presos pela Operação Ícaro, do Ministério Público de São Paulo (MP-SP). — Foto: Montagem/g1/Reprodução/TV Globo

Os fiscais entraram no alvo dos promotores depois que cinco certificados digitais em nome deles foram descobertos como sendo usados nas operações que teriam beneficiado empresas como a Ultrafarma e a FastShop.

Em agenda nesta segunda (25), o governador Tarcísio de Freitas afirmou que "todo mundo que estiver envolvido [no esquema fraudulento] vai ser afastado. Eles vão sentir a mão pesada do estado. A gente não vai tergiversar sobre esse assunto. Vamos mudar todos os procedimentos que precisar para garantir a segurança do sistema. O que precisa ser feito, vai ser feito. A gente vai ser implacável com isso aí".

Em nota, a secretaria informou ter instaurado sete processos administrativos disciplinares e aberto 20 apurações preliminares para investigar a conduta dos servidores investigados (leia a íntegra abaixo).

Por causa do esquema, Sidney OIiveira, dono e fundador da Ultrafarma, foi preso, além do diretor estatutário do grupo Fast Shop, Mario Otávio Gomes, e do fiscal fazendário Artur Gomes da Silva Neto, que já havia sido exonerado.

Os dois empresários conseguiram habeas corpus na Justiça e foram soltos sem necessidade de pagamento da fiança de R$ 25 milhões estabelecida pelo juiz do caso.

Segundo apuraram g1 e GloboNews, além da Ultrafarma e da FastShop, outras quatro empresas beneficiadas pelo fiscal Artur Gomes da Silva Neto – considerado o cabeça do esquema e que continua preso – também estão sendo investigadas.

As empresas são suspeitas de pagarem propina aos funcionários da Sefaz-SP com o objetivo de agilizar pedidos milionários de ressarcimento de créditos de ICMS-ST.

Os nomes dessas novas companhias apareceram depois da quebra de sigilo telemático do e-mail do fiscal considerado o operador do esquema que movimentou mais de R$ 1 bilhão.

O que diz a Secretaria da Fazenda

"A Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP) instaurou, na última sexta-feira (22), sete processos administrativos disciplinares que resultaram no afastamento de seis auditores fiscais da Receita Estadual, além de Arthur Gomes da Silva Neto, que já havia sido exonerado.

'Em São Paulo não haverá espaço para a impunidade. Determinamos o afastamento dos servidores e estamos colaborando com todas as investigações. A punição vai ser rigorosa em todas as esferas para garantir que cada centavo retorne aos cofres públicos. Não valor tolerar desvio de conduta. A gente vai afastar, investigar, punir e recuperar o recurso, e todos os envolvidos sofrerão as consequências”, destaca o Governador Tarcísio de Freitas.

As medidas são uma resposta às apurações preliminares da pasta no âmbito da Operação Ícaro, que investiga irregularidades relacionadas ao ressarcimento do ICMS-ST. Os trabalhos em andamento incluem ainda a abertura de outras 20 apurações preliminares voltadas à análise da evolução patrimonial e à verificação de indícios de irregularidades.

A pasta já havia revogado a Portaria CAT nº 42/2018, que regulamenta os procedimentos de complemento e devolução do imposto, e o Decreto nº 67.853/2023, que previa a “apropriação acelerada” do crédito tributário. A partir de agora, todos os pedidos de ressarcimento passarão, obrigatoriamente, por auditoria fiscal até a conclusão da revisão de todos os protocolos. Um grupo de trabalho, instituído no dia 15, conduz a revisão das regras de conformidade e a reestruturação do processo de ressarcimento, incluindo o uso de soluções tecnológicas e o cruzamento automatizado de informações, de forma a reforçar a integridade e a transparência."

‘Confissão' espiritual

Artur Gomes da Silva Neto – considerado o líder do grupo criminoso – teve a prisão preventiva decretada pela Justiça de São Paulo na última terça-feira (19), a pedido do MP-SP.

No pedido, os promotores apontaram que ele era o líder do grupo criminoso, "fazendo orientações, compilando documentos, deferindo os créditos, bem como fazendo a cessão destes para outras pessoas jurídicas, conferindo celeridade à análise daquelas empresas que lhe pagam propina”.

Os promotores também disseram que apreenderam várias anotações na casa dele que confirmam a participação do servidor nos desvios. Entre as provas estão uma carta manuscrita supostamente escrita pelo próprio auditor fiscal.

Endereçada a uma suposta entidade espiritual, o auditor relata que está prestes a assinar documentos favorecendo uma empresa particular e não quer se prejudicar.

“Da outra vez, eu perguntei para os guias do seu pai. Eles disseram que eu podia assinar, podia trabalhar com esse empresário. E deu esse problema imenso. Não posso mais fazer outro trabalho aqui e depois correr risco e ter que fazer trabalho espiritual de novo”, diz a carta a que o g1 teve acesso.

“A proposta dele é eu assinar novas liberações de imposto para ele. O mesmo trabalho que eu fiz antes. O perigo é meu nome ficar mais uma vez exposto. Pode correr o risco de ter qualquer outra denúncia contra esse empresário no futuro. E o risco de pessoas de dentro da Secretaria da Fazenda ficarem vasculhando isso. Muito perigoso eu assinar outros documentos igual aos da outra vez”, aponta o documento encontrado pelos investigadores.

Para os promotores, a referida carta “demonstra e confirma o esquema criminoso operado por Artur, além da intenção do fiscal em manter o sigilo para viabilizar a continuidade do esquema criminoso”, disse o pedido de prisão preventiva.

O pedido foi acatado pelo magistrado Paulo Fernando de Mello, da 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital. Na decisão, ele afirma que “há prova da prática criminosa e indícios suficientes de autoria delitiva em desfavor do investigado, caracterizando-se o requisito objetivo da custódia cautelar”.

O juiz justifica a manutenção da prisão afirmando que “não se pode ignorar que grande parte dos valores ilícitos ainda se encontra em poder do grupo criminoso, resultando na possibilidade de evasão, o que, inexoravelmente, implicaria no retardamento da marcha processual”.

O g1 tentou contato a defesa do auditor preso, mas não teve retorno até a última atualização desta reportagem. 


Segundo investigação, um auditor fiscal facilitava o processo de ressarcimento de créditos para favorecer empresas em troca de propinas de mais de R$ 1 bilhão. — Foto: Arte/g1

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